8.10.05

A Carta

- Ele vai responder!

Repetia isso sozinho, enquanto escrevia uma carta para aquele que era responsável, durante longos 8 anos, pelos seus presentes de natal.

A caneta parecia dancar por sobre o papel, desenhando aquela letra graúda e cheia de garranchos de um menino negro que, apesar da pobreza, era um gênio na arte de desenhar. Sua mão fabricava aquilo com tamanha concentração e fé, que nem seus pais ousaram interrompe-lo para o jantar. As vezes sua mãe, uma mulher alta e de olhos que iluminavam tudo aquilo que via e com uma voz suave e doce, de cor azul e sentimentos sublimes, entrava no quarto e ficava ali, a observar o seu querido filho imerso naquele trabalho sem precedentes. Imaginava o seu futuro como, talvez, um escritor famoso que venderia inúmeros best-sellers. E ficava lembrando dos seus tempos de menina, dos seus tempos de cartinhas para o papai noel. Bons tempos aqueles.

- Acabei! gritou o menino. Ele tomou a o papel em suas mãos, releu cuidadosamente, colocou-o no seu envelope azul, comprado na papelaria do lado, e guardou em cima da sua pequena janela.

Ele, notando que a mãe estranhara aquela atitude, disse ao seu ouvido:
- Ele vem aqui esta noite! pediur para eu colocar essa carta em cima da janela do meu quarto, fechar os olhos e esperar que ele vinha buscar.

A mãe olhou carinhosamento para o seu filho, deu-lhe seu pijama e foi terminar de arrumar a mesa, para ir se deitar com o marido.

Horas depois lá foi ela dar o ultimo beijo em seu filho, abriu devagarinho a porta do quarto, encontrou-o estirado sobre a cama, com aquela cara angelical que só as crianças sabem fazer quando estão durmindo. Aproximou-se da janela, de olho fixo na carta. Pegou-a. Abriu devagarinho, imaginando o que tivesse escrito. Leu. Caiu em prantos.
Não entendia como aquele menino tinha tamanha consciência. Seu pedido era simples. A cura da sua mãe, que padecia de uma dorença rara e em alguns poucos dias, iria falecer. Ela havia se esforçado tanto para manter aquilo tudo em segredo, não sabia como ele tinha descoberto. Sua lágrimas não paravam de cair silenciosamente, percorrendo aquele rosto bonito e enfermo que a natureza houvera lhe dado. Sua mãos tremiam e sentiam que a cada segundo, o sopro vital daquele corpo de 25 anos se esgotavam lentamente. Soprei e desfiz aquele momento de inércia.

Ela então colocou a carta, enxarcada de suas lagrimas, no envelope azul e em seguida em cima da janela.

Antes de sair do quarto olhou, mais uma vez, a carinha do seu filho que, embriagado pelos seus sonhos, virava de um lado para o outro da cama mudando, por vezes, a expressão daquele belo rosto sonhador e inocente. Beijou-lhe o rosto com tanto amor que foi dificil, até mesmo para mim, segurar as lágrimas. Sabendo da minha tarefa, toquei então o seu ombro. Ela estremeceu, senti os arrepios de seu corpo. Virou-se assustada, porém conformada com que estava por vir. Notei que seus olhos se enchiam de lágrimas ao me ver. O brilho dos seus olhos estava tão intenso, que a minha tão simples tarefa, parecia mais um árduo trabalho. Peguei a carta e li lentamente ao seu ouvido, enfatizando as partes em que ele declarava um verdadeiro amor à sua mãe. Cumprindo o meu dever, peguei as suas mãos, e guiei-as para escrever o um bilhete. O Ultimo.

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