9.5.06

Rótulos, leitura e cantadas.

Algo que vem me chamando a atenção de uns anos atrás pra cá, é a tendência geral de rotulação das coisas. Se algo existe, isso deve ser rotulado. Uma rotulação que identifique todas as qualidades e defeitos do produto e que a pessoa, ao adquiri-lo, saiba de antemão quais serão as vantagens e desvantagens dessa aquisição.

Essa rotulação tem um lado bom. Ao saber o rótulo que o produto, a música ou a pessoa tem pode-se antecipadamente prever algumas reações e evitar equívocos ao entrar em contato com eles, por exemplo: ninguém em sã consciência nunca vai chegar numa menina que esteja de salto, com uma blusa rosa, uma calça colada, usando um perfume extremamente doce e a cara completamente maquiada e perguntar se ela já ouviu Velvet Underground ou até mesmo The Strokes, concerteza a pessoa não saberá nem de que planeta é isso. E também não espere, ao comprar um CD de Sandy e Junior, ouvir uma música do estilo de Manowar ou dos Beatles. Será decepcionante.

Esse fenômeno é, também, bem interessante. Pois através dele podemos criar categorias de pessoas que pensam da mesma forma, agem da mesma jeito e ouvem a mesma coisa, muitas vezes apenas pelo seu modo de vestir ou o seu jeito de falar. É uma perda total e geral da personalidade e da individualidade de cada um. É uma massificação de comportamento tão grande que às vezes parece que não existem pessoas diferentes mas sim grupos diferentes. E o mais triste disso tudo é que também resulta numa massificação da visão política, ideológica e social. Ou seja, uma total dissolvição do senso crítico e da capacidade de raciocínio das pessoas. "Eu não gosto da Globo porque todo mundo do meu grupo diz que a Globonão presta" esse é um pensamento comum que pode ser observado em alguns grupos, por exemplo.

Pondo-se a analisar as causas de tal fenômeno, vem logo a midia e a indústria cultural como primeiras opções. Em uma determinada parcela, elas são culpadas sim. Através da massificação do comportamento, da ideologia e do que é vendido e mostrado ao consumidor, ela consegue massificar também as pessoas. E elas, por sua vez, começam a achar que fazer parte de um grande grupo é bom e normal. E o mais interessante, seja ele um grupo totalmente "televisionado" ou seja um grupo de pessoas que dizem não gostar de televisão(principalmente alguns canais) sem saber, muitas vezes, o porquê não gostam. A outra parcela de culpa vai para o sistema educacional brasileiro que todos já estão cansados de saber que ainda é falho, errado e deixa muito a desejar. Mas tem-se também um outro grande vilão que, de todos, é o mais difícil de ser eliminado. A cultura brasileira da não-leitura.

O hábito brasileiro de não ler torna o brasileiro mais suscetível a isso tudo. Porque o desenvolvimento da leitura - principalmente da boa leitura - gera raciocínio, senso crítico e conhecimento além de contribuir para a eliminação da famosa "preguiça de pensar". Assistir um filme sobre um determinado livro é fácil, vem tudo enlatado, pronto e devidamente rotulado. Ler o livro desse mesmo filme é diferente. A leitura obriga principalmente a imaginação e a reflexão. Não há como ler um livro e entende-lo se o leitor não se utiliza dessas duas dádivas humanas. E na situação em que estamos, até mesmo a leitura "comercial", tantas vezes criticadas e mal-vista pelos eruditos, deve ser incentivada como inicio de formação de novos leitores. Não há como alguém que nunca sequer leu uma bula de remédio partir logo para autores como Dotoiévski e Machado de Assis. Se isso acontecer, o susto será grande. Tem que se começar com Sidney Sheldon, J. K. Rowling e Paulo Coelho mesmo! Afinal, dar o doce inteiro logo de cara é sem graça e pode assustar, mas da-lo aos poucos e processualmente pode mostrar todos os prazeres dele a uma pessoa.

Mas enquanto isso não acontece, fiquemos com os nossos queridos rótulos. O bom disso tudo é que dá para ter uma cantada certa e infalível para cada tipo de mulher...

Ps. Desconsiderem a brincadeira infame do último paragrafo, foi só para descontrair. Não reflete o verdadeiro pensamento do autor.

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